Matéria publicada
na Folha de São Paulo, no Caderno Cotidiano
do dia 15 de maio de 2006.
"Centralizar polícia foi crucial na Colômbia",
diz general
RAUL JUSTE LORES
O general Óscar Naranjo, diretor da Polícia
Judicial da Colômbia, está há 30 anos
na Polícia Nacional de seu país. Nos últimos
20, ele esteve em todas as operações que desbarataram
alguns dos maiores cartéis de droga no mundo, como
o de Medellín.
Apesar de as guerrilhas das Farc (Forças Armadas Revolucionárias
da Colômbia) e dos paramilitares ainda fazerem daquele
país um dos mais violentos do mundo, Bogotá conseguiu
derrotar os grandes cartéis, que produziam atentados
e desafiavam a polícia colombiana -ao estilo do que
promove agora a facção criminosa PCC. Naranjo
explicou à Folha como Justiça, forças
especiais e uma presença mais forte nas favelas foram
decisivas.
Folha - O combate às drogas é totalmente
centralizado?
Óscar Naranjo – Não temos polícias
locais. Para combater o narcotráfico, é uma
vantagem. Polícias locais são muito frágeis
diante do crime organizado porque os policiais e suas famílias
têm muito a perder se vivem no mesmo lugar onde moram
os traficantes.
A seleção também é importante.
Precisa ser força de elite. Usamos forças de
inteligência, respaldadas por pequenos comandos para
a captura. Usamos até detector de mentiras e acompanhamos
o rendimento de cada policial.
A queda da criminalidade é reflexo dessas mudanças.
Cada comunidade precisa ter polícia ali. Hoje temos
130 mil efetivos, 32 mil a mais do que há três
anos. Em 2002, houve 28 mil homicídios na Colômbia.
No ano passado, foram 18 mil. É muito ainda, mas foi
uma recuperação formidável.
Folha - Quais foram as medidas mais bem-sucedidas?
Naranjo - Foi criada uma jurisdição especial
só para julgar os traficantes, com "juízes
sem rosto", como ocorreu no direito penal italiano para
julgar a Máfia. Não consta do processo a identidade
do juiz para que não seja objeto de ameaças,
intimidação ou morte. As equipes de inteligência
foram fortalecidas. Também criamos os Corpos Especiais
Armados, uma força de elite policial. Fazíamos "blocos
de Busca" para perseguir os cabeças dos cartéis.
Por último, o governo nomeou uma "secretária
presidencial" para cuidar exclusivamente das favelas
de Medellín. María Emma Mejía era responsável
por criar políticas sociais para as favelas, com novas
escolas, centros de saúde e convivência. Mejía
virou chanceler do país depois. Ela tinha a responsabilidade
política de recuperar a confiança no Estado.
Folha - Como são essas forças?
Naranjo - Um corpo de policiais muito qualificado, especializados
em inteligência e operações urbanas.
Eles só operam em grupo, no mínimo 30 homens.
Nunca patrulhas pequenas. Com alta capacidade de mobilização,
só em carros blindados, coletes antibalas para fazer
operações em profundidade nessas favelas. Temos
instrutores americanos e britânicos.
Folha - Mas eles não eram recebidos à bala
na entrada das favelas?
Naranjo - Sim, mas não pode haver terrenos vedados
ao Estado. Os ataques à polícia visam criar
uma nova frente de atenção pública e
institucional. Há interesse para deslegitimar toda
a ação do Estado. Temos que resistir a isso.
Sempre que se extraditava um chefão para os EUA, eles
atacavam a polícia. Pablo Escobar decretou guerra
para conter os processos de extradição. Houve
atentados contra juízes, policiais, prédios
públicos. Mais de 500 policiais foram mortos em Medellín
em 14 meses, entre 1990 e 1991.
Folha - Aqui os chefões continuam a dar ordens da
prisão. Como foi feito esse isolamento?
Naranjo - A extradição para os EUA funcionou.
Há sete anos, foram criadas duas cadeias de altíssima
segurança, para 1.500 prisioneiros cada uma, só para
terroristas e narcotraficantes. Essas prisões não
estão em centros urbanos. Foram construídas
em zonas isoladas e têm disciplina especial. Todos
usam uniformes, é proibida a circulação
de dinheiro. Visitas, só de parentes e advogados.
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