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Segurança

Das quadrilhas às máfias

Por: Hugo Acero Velásquez

Na atualidade, em alguns países da América Latina, se está vivendo um rápido processo de transformação das pequenas quadrilhas e bandos de delinqüentes em grandes estruturas que suportam o crime organizado transnacional e que controlam em cada país, fundamentalmente, o mercado de consumo interno de drogas.

São organizações com uma direção centralizada, sendo compostas por milhares de membros, controlam territórios, manejam negócios ilegais, mantêm estreitas relações com o crime organizado transnacional e têm presença em cidades importantes da América Latina e de outros países, como dos EUA e da Europa. Estes grupos do crime organizado, sustentados fundamentalmente pelo narcotráfico, criaram ou estão criando verdadeiras estruturas mafiosas que controlam os mercados internos de distribuição de drogas em cada país, além de se vincularem com outros delitos internacionais, como o comércio ilegal de armas, tráfico de pessoas e o contrabando.

É o caso das Maras na América Central que, segundo as autoridades desses países, contam com mais de 100 mil membros e que tem presença em quase todos os países da região, inclusive no México e em algumas cidades norte-americanas e européias. As Maras, que são apontadas como responsáveis pela crescente piora da segurança dos cidadãos da região, está se envolvendo com o tráfico de drogas que através da América Central atinge o mercado norte-americano e o europeu, tendo relação com os cartéis de Tijuana, Juarez e os do sul do continente, incluindo os colombianos.

No Brasil o “Primeiro Comando da Capital” (PCC), que recentemente fez um motim generalizado em 105 presídios, paralisou por vários dias a cidade de São Paulo, centro comercial e industrial mais importante da América Latina, assassinou mais de 100 pessoas, especialmente policiais, incendiou 82 ônibus e atacou 17 agências bancárias, se constituindo em uma importante organização criminal que controla os presídios e o mercado de drogas dessa cidade e de outras no país. Com similares características no Rio de janeiro o “Comando Vermelho” e o “Amigos dos Amigos” controlam as Favelas e o mercado local de drogas. Segundo as autoridades de inteligência do Brasil, estes grupos têm relação com os cartéis de droga e grupos insurgentes da Colômbia, em especial com as FARC.

Equador é outro país que está vivendo esta situação com “Los Ñetas” e “Los Latin King”, grupos criminosos que têm presença em algumas cidades desse país e em importantes cidades dos EUA e da Europa, como é o caso de Madrid e Barcelona na Espanha, e Nápoles na Itália. Estes grupos, além de serem apontados como os responsáveis da piora da segurança cidadã nessas cidades, no Equador está mergulhado no mercado interno de drogas e em outras atividades ilícitas.

Na Colômbia os grupos paramilitares que não se desmobilizaram com o processo de paz que impulsionou o Governo do Presidente Álvaro Uribe, assim como alguns ex-paramilitares que seguem exercendo atividades ilícitas, controlam, em alguns casos, desde o presídio até os diversos grupos criminosos, constituindo verdadeiras estruturas criminais que controlam territórios de cultivos ilícitos, o mercado de drogas, o comercio ilegal de armas e outras atividades ilegais.

Estes grupos que não somente deterioram a segurança dos cidadãos em seus paises mas também em outros países, constituíram organizações criminais que atentam contra a legitimidade institucional estatal, na medida em que deixaram evidente a debilidade dos estados para combatê-los e eliminar essa ameaça à segurança interna. Em todos os casos, os governos têm se vistos obrigados a negociar com esses grupos e seus líderes para que a violência que geram seja menor, como foi o caso dos diálogos com “o velho Lin” das Maras em El Salvador, com Marcola, líder do Primeiro Comando da Capital, em São Paulo, Brasil, com Novoa, líder de “Los Ñetas” no Equador e Don Berna, na Colômbia, que passou dos grupos criminais para os paramilitares que se sentaram a negociar a paz com o Governo.


Considerações gerais

Com o objetivo de acrescentar elementos para a análise destas novas estruturas criminosas, na continuação se expõe uma série de considerações:

1. Os mercados de consumo interno de drogas que estão afetando a segurança dos cidadãos em todos os países da América Latina, desde o Canadá até a Patagônia no extremo sul do continente, cada vez mais estão sendo controlados por estruturas criminais locais que tendem a recrutar e dominar as pequenas quadrilhas e bandos de criminosos. Já não estamos frente um fenômeno de delinqüência menor, e sim diante de verdadeiras estruturas criminais que tratam de se assemelhar com as organizações mafiosas internacionais.

2. No controle desses mercados internos jogam um importante papel as quadrilhas e grupos criminosos que, pouco a pouco, estão se transformando em estruturas criminais bem organizadas que respondem a grupos mafiosos internacionais e suas atividades, como são: o trafico de drogas, o comércio ilegal de armas, o trafico de pessoas, o contrabando, a lavagem de dinheiro, etc. Já não estamos falando de pequenos grupos criminosos, e sim de estruturas que controlam territórios e negócios ilícitos.
Desta situação não se salvam nem os países que tem bons níveis de segurança aos cidadãos, como é o caso do Chile, onde alguns bairros de Santiago são controlados por comerciantes de droga e aonde Carabineros do Chile apenas tenta retomar estes territórios.

3. Os governos locais como prefeituras, governos estaduais e em alguns casos, até governos federias, não estão preparados para enfrentar estes novos desafios que o crime organizado internacional impõe, o qual está utilizando e profissionalizando estruturas criminais nacionais para seus interesses, em especial para a comercialização local de drogas.

4. Estas estruturas criminais têm interferido e vão continuar interferindo na política para poder incidir nas decisões dos estados, em especial nos poderes legislativo e judiciário; talvez não façam tam diretamente como o fizeram os narcotraficantes colombianos, mas o fazem através de testas-de-ferro a quem eles financiam as campanhas e direcionam recursos ilegais.

5. Cada vez mais estas organizações estão constituindo verdadeiros grupos de pressão perversa, na medida que intimidam com violência criminal e fazem chantagem aos governos e seus cidadãos com a ameaça de utilizar essa violência em qualquer momento se não são aceitos seus pedidos, como se sucedeu no Brasil e na Colômbia ou na ameaça dos Maras de matar os presidentes ou os funcionários, como foi o caso de alguns países da América Central.

6. Frente a este novo desafio, que atenta contra a segurança dos cidadãos e dos governos democráticos, não se pode seguir trabalhando somente com a ótica da repressão direta, sendo necessário que as instituições, em especial as de inteligência, coordenem; tampouco se pode centrar a solução em métodos de controle e repressão unicamente, sendo necessário desenvolver políticas integrais de grande fôlego, indo desde a prevenção até o controle e coerção; tem que desenvolver políticas públicas integrais de convivência e segurança dos cidadãos. Também é importante que os Estados latino-americanos coordenem esforços, não se pode seguir trabalhando cada um por si, como se fossem problemas particulares de cada país, sendo necessário unir esforços de cooperação para entender esta problemática e enfrentá-la da melhor maneira possível. Uma política de segurança conjunta pede que seja compreendido que se está frente estruturas criminais de caráter transnacional, que têm de ser enfrentadas desde o local, indo sua ação mais além do que simplesmente os municípios, prefeituras, governos estaduais e nacionais.

7. Finalmente, se os governos latino-americanos não adotarem políticas integrais locais, nacionais e transnacionais para combater estas estruturas criminais que já não são simples quadrilhas ou bandos, cada governo por seu lado, ante a impossibilidade de controlá-los, optará, como estão fazendo alguns, por ceder frente aos criminosos e negociar através do diálogo como se fossem organizações políticas. Cabe enfatizar que com esta opção os estão fortalecendo e validando como interlocutores sociais válidos, quando o que cabe frente a esse tipo de organizações criminais é a perseguição policial e judicial.

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